Fotografia © Andrew Small | Cartaz © Laura Almeida Azevedo


As minhas manhãs são sempre frias. Tão frias, que eu posso ver a transparência do sol. Ouço os pássaros verdes, cantando o cântico da paixão. Procuro o calor das tuas mãos e o amor que nada mais é do que uma ilusão.

Há quanto tempo não nos amamos?

Será que algum dia existiu paixão nos nossos corpos?

Ou será que o que existiu, entre nós, foram apenas desejos e frases banais repetidas até à exaustão pelos nossos corações? Será que não foi assim que tentámos segurar toda esta emoção de que até nós próprios duvidávamos?

Daqui a pouco, volta a amanhecer. Os raios de sol, tímidos, já começaram a entrar, mesmo sem permissão, pela cortina aberta da minha janela. Ainda estou deitada, mas consigo ver o mundo lá fora. E vou continuar a fingir que não importo. Vou continuar a fingir que te espero. É assim que o meu corpo vive, desde que o nosso amor esfriou. Este corpo, que não quer sentir o que o coração lhe grita a toda a hora.

Há tanto tempo! Mas tanto tempo mesmo!

Deixámos que o silêncio se instalasse entre nós os dois. Esquecemos o homem e a mulher que somos. Esquecemo-nos de escutar a voz do nosso coração. De ouvir os seus gritos de amor. Esgotámos as palavras que tínhamos um para o outro. Virámos as costas ao que sentíamos. Tornámo-nos desconhecidos.

Falta-nos o calor da fogueira da paixão. Fomos ficando, com o passar dos meses e dos anos, indiferentes à chama desse desejo que, um dia, nos aproximou. Deixámos que a ausência fosse a rota do nosso viver.

Mas isso não é vida. A isso chama-se sobreviver. É isso que hoje eu sou. Uma sobrevivente nesta vida fria, em que nada me aquece. Neste meu viver, em que todas as manhãs são frias. Porque há muito tempo que deixei de saber o que era o calor do amor.

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