Deixou-te ir

Deixou-te ir. Mas, lembra-te que se fores já não voltas.

Deixa-me ficar no meu cantinho. Deixa-me pisar as pedras frias da calçada, para que me possa refrescar desta revolta. Se queres liberdade. Se queres voar por esse céu que te fascina o olhar. Se é isso que o teu coração quer. Vai e deixa-me no meu mundo, a solidão não me assusta. O sofrimento não me irá matar. Se já não há mais espaço para mim na tua rua, deixa-me ficar no meu beco.

Não te corto as asas. Quero-te ave livre. A minha gaiola não tem porta, podes sair quando quiseres. A liberdade também será minha e permite-me correr, por onde me apetecer.

Vou voltar a dançar naqueles prados verdes onde já fui feliz. Vou banhar-me nua nas águas do rio tímido, que corre por entre as montanhas. Vou purificar-me nos braços da floresta virgem, onde posso esquecer-me de que existe tempo. Vou lavar a minha alma na fonte dos sentimentos. Despir-me destes lamentos e ficar ali nua, a sentir o fluir do meu pensamento.

Vou pedir um desejo à lua. Pensar em tudo e ao mesmo tempo não pensar em nada. Deixar que o tempo passe. Que o tempo leve com ele tudo o que já não me pertence. Deixar que ele leve o meu amor por ti, que o torne numa leve recordação. Se não me queres, vou encontrar-me a mim e continuar a viagem até ao fim.

Sim, deixa-me ir. Não sei, se saberei deixar de te amar. Não sei, se algum dia te esquecerei. Foste uma gota de água, neste oceano da minha existência. Mas, não foste uma gota qualquer. Foste a gota de água que me saciou, quando a minha alma já se sentia desfalecida. Só não poderei exigir-te, que fique para sempre no meu copo de água. Se o que queres é saltar para outra lagoa, o caminho está livre. As asas são tuas, deixaste levar por esse vento que te trouxe o cheiro da tentação.

Só te peço, para que tenhas consciência de que o rio nasce no monte. Vai contornando as curvas da montanha, até abraçar o mar. É esse percurso que te fascina. Mas lembra-te, que não podes fazer o percurso em sentido contrário. Já alguma vez viste o rio nascer no mar e desaguar no monte. Não, é isso que te pode acontecer a ti. Se começares a descer esta montanha, já cá não voltas.

Deixa-me ir, com as lágrimas a fazerem um rio na minha face. Mas, não me peças para te receber de braços abertos, quando o mar se tornar demasiado revolto para a tua frágil nau. Eu fico bem por aqui e tu seguirás a rota que traçaste para os teus dias.


@angela caboz

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